The Fall of the Stars: Capítulo 4 - Vida
- AngelDark

- 14 de jul.
- 42 min de leitura
Volume 3 : Sentido da Vida
Parte 1
Presente:
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De volta ao labirinto infinito, Layla agora observava a sala, como se estivesse procurando pelos alvos do teste. Mas, ao passar os olhos por Dante, suas pupilas dilataram e seu rosto corou, enquanto um sorriso pequeno, mas distorcido, surgia em seus lábios.
Dante conseguia sentir aquilo no fundo de si, aquela sensação. Mas será que essa sensação era real ou apenas mais uma ilusão criada por seus próprios sentimentos?
Ryunosuke, então, dá o sinal que inicia a vez de Layla. Todos a observavam, esperando alguma habilidade como a de Vivian. Foi quando Layla retirou duas pistolas e começou a disparar. Ela atirava sem pensar, só que todos tinham a certeza de que seria impossível as balas acertaram, uma vez que aquela sala distorcida e infinita era imprevisível e parecia estar se movendo. Até que as balas chegassem aos cristais, estes já estariam em outro lugar. Além disso, nenhum dos cristais estava em local visível a olho nu.
Mas, ao continuarem prestando atenção nas balas, notaram que aquelas que voavam pelo ar começavam a se chocar. Algumas eram disparadas em velocidades diferentes, de modo que uma podia colidir com outra e, então, mudar de direção. Ela estava disparando de forma a fazer as balas descreverem curvas, como se quisesse guiá-las por todo o caminho até o cristal.
Todos começaram a encará-la, incrédulos. Para ser capaz disso, primeiramente, ela precisaria saber onde os cristais estavam. Mas estes não pareciam emitir "ether" suficiente para revelar suas localizações. Ela também não parecia ter usado nenhuma habilidade especial para descobrir a localização dos alvos. Ao mesmo tempo em que todos queriam saber como ela descobriu a localização, não conseguiam desviar o olhar para perguntar, prestando atenção total à trajetória das balas, ansiosos para ver até onde ela continuaria guiando os projéteis.
— Você notou?
perguntou Luck para Dante, sem se virar.
— ...
Mas Dante apenas permaneceu em silêncio.
— O quê? O que vocês notaram?
perguntou Kurokawa, também encarando os disparos.
— Cada vez que uma bala atinge outra, o projétil atingido fica ainda mais rápido. Normalmente, deveria desacelerar, mas está exibindo um comportamento bizarro — respondeu Chuya, ao lado.
— Calem a boca e prestem atenção, seus merdas! Não dá para dizer que essa seja a habilidade dela — disse Kai, olhando atentamente.
— Com essa visão dela, a maldita parece saber até o sentido rotacional da bala.
“Parece que quando um dos projéteis vão atingir outro, além de fazer contato no ângulo certo para mudar sua direção, ela faz com que a força centrífuga de um projétil acelere o outro, o que causa o aumento de velocidade. Então, ainda é cedo para dizer que isso é a habilidade dela, seus idiotas!”
Kai analisava a técnica de Layla tentando decifrar seu funcionamento.
“Ainda assim, ela está fazendo isso com mais de quatro tiros principais e diversos tiros secundários para controlar a rota dos quatro principais. A quantidade de cálculos que ela precisa fazer para controlar tudo isso…”
— Kin, acha que consegue copiar essa habilidade?
perguntou Mio, no canto, junto de Beatrice e Kintoki.
— Não seja idiota. Eu nem consigo identificar isso como uma habilidade gifted. Se eu não entender como a habilidade funciona e a reconhecer, não posso copiar. Por que você não se transforma nela e tenta descobrir a habilidade dela? — Kintoki respondia.
— Impossível. Não acho que conseguiria me aproximar o suficiente para tocá-la
“Além disso, mesmo que eu me transformasse nela, não conseguiria usar a habilidade enquanto também não a tivesse entendido.” — Mio murmurava em pensamento.
Enquanto todos continuavam encarando incrédulos percebendo o quão complexo era o que estava acontecendo frente a seus olhos, os projéteis de Layla continuavam sua dança mortal pelo labirinto arquitetônico. Não era apenas uma questão de ricochetear balas; era uma coreografia de altíssima precisão em um palco tridimensional caótico.
Os projéteis secundários, aqueles disparados com velocidades e ângulos variados, não eram meros ajustes de curso. Eram peças de um quebra-cabeça cinético sendo montado em tempo real. Uma dessas balas de ajuste colidia com um projétil principal não em um ponto qualquer, mas em um local específico de sua superfície curva, aproveitando a rotação mencionada por Kai. O impacto, calculado ao milissegundo, não só alterava o vetor de direção, guiando a bala principal por entre passagens flutuantes ou ao redor de escadas que levavam a lugar nenhum, como também transferir energia de uma forma que desafiava a lógica – resultando na aceleração bizarra que Chuya notou.
Era como se Layla estivesse jogando uma partida de sinuca quadridimensional, onde as bolas eram suas próprias balas, as tabelas eram outras balas em movimento, e a caçapa era um alvo invisível e móvel naquele espaço distorcido. Controlar a trajetória de uma bala dessa forma já seria genial; controlar múltiplas, criando colisões em cadeia onde cada impacto era simultaneamente um ajuste de rota e um gatilho de aceleração para o projétil seguinte na sequência... isso beirava o sobre-humano.
"Ela não está apenas prevendo a trajetória das balas dela,"
Kai murmurou para si mesmo, os olhos fixos na teia de rastros luminosos que agora pareciam preencher partes do labirinto.
"Ela está prevendo as micro-distorções espaciais desta sala maldita. Quando olhou ao redor, ela não estava tentando encontrar as chamas, mas sim memorizando os formatos das coisas – dos espelhos, escadas e corredores – e a forma como eles se comportavam, se moviam e mudavam, para conseguir incluir todos esses detalhes em seus cálculos. Ela está usando a própria imprevisibilidade do ambiente como parte da equação."
Era a única explicação para como ela conseguia guiar os projéteis para locais que sequer podiam ser mapeados visualmente de forma direta. Sua análise avançada não se limitava às balas; ela processava a geometria impossível do local, talvez percebendo sutis variações ou ecos de 'ether' que denunciavam a posição das chamas ocultas, usando essas informações para calcular os pontos de impacto necessários.
E então, aconteceu. Um clarão azulado irrompeu em um canto do teto que também era chão, um ponto que deveria ser inalcançável por qualquer tiro direto ou simples ricochete. Uma das balas principais de Layla, após ser "empurrada" por três colisões perfeitamente sincronizadas com balas secundárias – cada uma acelerando-a mais que a anterior –, atingiu em cheio uma das chamas azuis. Esta, frágil, desfez-se instantaneamente ao contato.
“Impossível... A precisão... A quantidade de variáveis…”
O pensamento de Kai foi interrompido por outro som.
Quase simultaneamente, em outra parte da sala distorcida, uma segunda sequência de colisões se completava. Desta vez, a bala principal, visivelmente mais rápida que a anterior, realizou uma curva fechada ao redor de uma coluna flutuante antes de ser atingida por um projétil secundário vindo de uma direção completamente inesperada – talvez ricocheteado propositalmente em um dos espelhos distorcidos. O impacto final foi brutalmente preciso. A bala atingiu uma chama verde, não apenas tocando-a, mas colidindo com força suficiente para quebrar sua essência que exigia contato sólido. Duas chamas extintas em segundos, através de um método que ninguém ali conseguia compreender totalmente.
O murmúrio entre os observadores cessou, substituído por um silêncio tenso e admirado. A habilidade dela não era apenas atirar bem. Era um domínio aterrador de análise, previsão e execução estratégica, desdobrando-se em tempo real na forma daquela balé letal de projéteis. Layla, alheia aos olhares fixos nela, recarregou as pistolas com um movimento fluido, seus olhos já varrendo o labirinto infinito, calculando as trajetórias para os próximos alvos, seu rosto impassível escondendo a mente que operava em níveis de complexidade assustadores. A questão não era se ela conseguiria atingir os alvos, mas como ela continuaria a desafiar a lógica e a percepção deles para fazê-lo.
Assim, Layla continuou, até que as quatro explosões foram ouvidas e todos percebessem que ela havia conseguido passar no teste com perfeição.
— Ei, Bea, isso de agora... foi mesmo uma habilidade? — perguntou Mio, meio assustada.
— Se está me perguntando, acho que sabe a resposta. Se fosse só uma habilidade, acha mesmo que todos estariam tão assustados vendo isso? O que vimos foi a demonstração de uma capacidade natural extraordinária.
Ryunosuke, observando-a, começou a anotar algo enquanto pensava:
“Layla Azael... Se não me engano, ela foi a única sobrevivente de seu grupo enviado à Torre Dates para confirmar se a mesma realmente havia parado suas atividades. Não sei por quê, mas ela me deixa apreensivo. Todos disseram que houve uma estranha mudança em sua personalidade após o ocorrido, mas ninguém prestou muita atenção, já que isso tende a acontecer com pessoas que passam por traumas, como ver todo o time morrendo. Ainda assim, essa história da habilidade dela ser apenas 'Aprimoramento' parece totalmente falsa... O que será que ela está escondendo?”
Enquanto Ryunosuke perguntava quem seria o próximo e os outros se encaravam, hesitantes, Dante continuava a observar Layla. A garota, percebendo o olhar dele, fez um pequeno gesto discreto. No instante em que Dante desviou o olhar rapidamente, talvez pensando em se voluntariar, Layla surgiu silenciosamente atrás dele, cobrindo seus olhos com as mãos e sussurrando em seu ouvido, sem que ninguém mais percebesse.
— Quem você acha que é? — sussurrou Layla.
O coração de Dante acelerou e um suor frio brotou em sua pele. Ela se aproximou ainda mais, pressionando o corpo contra as costas dele, antes de tirar as mãos de seus olhos e abraçá-lo por trás.
— Não vai responder? Assim eu fico triste... Mas tudo bem. Se for você, eu deixo-me tratar como quiser.
Layla continuou, com um sorriso nos lábios e o rosto completamente corado. Dante, em contraste, estava pálido e não sabia como reagir, permanecendo imóvel.
— Finalmente... finalmente eu te achei. Estamos juntos de novo e, dessa vez, eu não vou a lugar nenhum. De verdade...
Todo o corpo de Dante tremia, uma sensação estranha percorrendo-o. Ele engoliu em seco e começou a virar o rosto lentamente, apenas para encontrar os olhos espiralados da garota de cabelos brancos e seu sorriso perturbador muito próximos, enquanto ela falava em seu ouvido de forma sensual e provocante:
— Eu te peguei... agora você é meu.
Um calafrio percorreu toda a espinha de Dante, ao ponto de sua respiração vacilar. Nesse momento, Anna sentiu algo e olhou na direção dele. Quando seus olhos o alcançaram, ele estava sozinho; Layla já se afastava discretamente. Mas Dante estava visivelmente abalado e nervoso, respirando pesadamente.
— Quem é ela? — perguntou Anna.
— Você consegue saber o que estou pensando, né? Então já deve ter uma ideia — respondeu Dante.
— Não é tão simples assim. Eu não consigo ver todos os seus pensamentos de forma detalhada. Às vezes, são mais sentimentos, e eu acabo teorizando o que você está pensando a partir deles. Mas agora eu sei que você está sentindo várias coisas diferentes, algumas parecem até conflitantes. Por isso, não faço ideia.
— Esquece. Isso pode esperar. Agora não é hora, de qualquer forma.
“Parece óbvio que seja ela... Ainda assim, não posso me distrair. Este jogo não é só uma brincadeira, eu também tenho que usar isso para ficar mais forte. Não posso ficar caindo em toda distração que aparece e esquecer meu objetivo.”
Com isso em mente, Dante foi até o centro e falou:
— Bom, já que ninguém se apresentou ainda, acho que tudo bem ser eu agora, né?
Parte 2
Dante estava agora no local de Mio, pensando em como acertar os alvos. Ele havia fracassado nos testes anteriores, o que queria dizer que devia acertar agora. Mas como fazer isso? Sua habilidade até lhe dava a capacidade de controlar o tempo das coisas, mas como isso ajudaria em um teste como esse?, Dante se perguntava enquanto todos o encaravam, pensando em como ele agiria.
"Eu já imaginava que este seria um teste difícil para Dante. Com uma habilidade como a dele e com tanta experiência de batalha, ele deve ter total confiança no que sabe fazer e ser bom o suficiente para se garantir nisso. Mas essa pode se tornar sua maior fraqueza. Por isso, você deve superar a si mesmo se quiser ficar mais forte, embora eu saiba que não é fácil assim, só começar a fazer as coisas de forma diferente", pensava Ryunosuke.
"No navio, ele usou aqueles poderes bizarros e extremamente poderosos. Mas desde que os testes começaram, ele não demonstrou nada daquilo. Será que foi um evento único causado pela adrenalina, ou ele...?", refletia Mio.
— Vamos lá, seu merda! Mostre logo o que pode fazer para eu te superar! Não me venha ser derrotado por um desafio ridículo como esse… — Kai murmurava para si mesmo.
— O que acha, Luck? Ele consegue? — perguntou Kurokawa.
— Eu não sei. Dante até tem um bom repertório de técnicas a longa distância… na verdade, ele não tem. Pensando bem, eu só o vi jogando coisas e acelerando elas, mas eu nunca o vi controlar a direção delas nem nada do tipo, então talvez seja um desafio para ele — respondeu Luck.
— Yuki, o que você acha? — Mirai perguntou agora.
— Por que está perguntando para mim? Achei que era você quem tinha se aproximado mais dele… Mas eu não acho que ele tenha desistido. Aqueles não parecem olhos de alguém que está pensando em desistir.
— Hum… então é isso que parece para você — concluiu Mirai.
Dante, escutando as conversas em paralelo, virou-se e encarou Vivian.
"Ela usou uma espécie de telecinese para mover a tesoura e assim conseguir atingir as chamas."
Depois ele se virou e olhou para Layla.
"Já ela usou vários cálculos para acertar as chamas com disparos."
Mas como eu faço isso…?
Dante começou a pensar quando percebeu algo. Na realidade, como Layla havia descoberto onde as chamas estavam? Devia ter um truque nisso. Ele então encarou Layla, que dessa vez estava fazendo um sinal para ele, chamando sua atenção e depois apontando para o próprio olho, como se quisesse mandar uma mensagem. E então Dante entendeu.
"É isso!"
Dante se concentrou, mandando todo seu ether para o olho direito.
"Aquele sinal… Você está falando: use seu olho direito, não é, Layla?"
Dante concentrou todo seu ether em seu olho e assim começou a enxergar os rastros de ether.
"Tanto a técnica de Layla quanto a de Vivian acabam deixando rastros de ether por onde se movem. Layla tem uma capacidade sensorial tão boa que pode ver isso naturalmente. Mas como eu não pensei nisso antes? Usando isso, eu posso ter como base por onde os golpes delas passaram…"
Dante então percebeu algo que o chocou.
"Agora eu entendi! As chamas estão no mesmo lugar! Pensando bem, o professor nunca disse que moveria as chamas após elas serem destruídas, e nem havia necessidade. Com todo esse labirinto mudando, mesmo que as chamas fiquem paradas, os meios de chegar até elas vão mudar. Mas agora, sabendo disso, pelo menos consigo dizer onde as quatro chamas estão."
— Resta saber como eu faço para acertá-las — murmurou para si mesmo.
"Vamos, Dante, pense! Se você não começar a progredir agora, não vai chegar a lugar nenhum!"
Dante esvaziou sua cabeça, concentrou-se e repensou tudo em sua mente, analisando cada detalhe, inclusive a si mesmo. E assim, ele ativou sua habilidade.
Habilidade: Chronos
Esse era o nome da habilidade de Dante, o nome que ele mesmo colocou. Sua habilidade "Shaper" lhe dá a capacidade de imbuir um alvo com seu Éter. Ao estabelecer essa conexão etérea através do toque ou proximidade com sua aura, ele pode então modular o "tempo" intrínseco daquele alvo – acelerando-o, desacelerando-o, revertendo-o ou até mesmo parando-o momentaneamente em relação ao fluxo temporal normal.
Quando Dante nasceu, essa habilidade já estava dentro de si. Por ser um "shaper", ele nasceu com ela e teve sua ligação com ela fortalecida ao ponto de que, da primeira vez que a usou, soube exatamente como ela funcionava, como se a conexão dos dois explicasse fundamentalmente a habilidade. Mas em seu primeiro uso, a habilidade de Dante era bem mais simples do que é atualmente; ele não era capaz de acelerar ou desacelerar o tempo de nada além de seu próprio corpo, tendo sido necessário muito treino para conseguir atingir esse patamar. Assim, seu primeiro uso não veio com ele acelerando o tempo de outras coisas, e sim de si próprio. Ou melhor, de uma característica específica dele.
Ao imbuir seu cérebro (Mente) com Éter, Dante acelera seus processos cognitivos – processamento, raciocínio, memorização –, permitindo-lhe aprender e analisar conhecimentos em uma fração do tempo normal. Em outras palavras, Dante era capaz de "hackear" seu próprio cérebro e assim acelerar a capacidade humana de aprender, tornando-se alguém capaz de dominar coisas novas em um espaço curtíssimo de tempo.
Era assim que Dante sempre fez, e naquele momento, estava fazendo de novo: projetando várias simulações diferentes, analisando múltiplas possibilidades, fazendo diversos cálculos, revisando tudo que aprendeu e repassando cada detalhe calmamente. Um processo que normalmente demoraria dias de análise calma e detalhada era concluído por ele em questão de segundos.
— Agora é minha vez!
Dante falou com um sorriso enorme no rosto e uma expressão que dizia: "Eu vou conseguir". Um filete de sangue escorreu de seu nariz. Ninguém conseguia entender bem o motivo, mas sentiam algo completamente diferente, como se o Dante que eles tinham visto até agora tivesse mudado completamente. Aqueles que não faziam ideia do que havia ocorrido estavam apenas confusos com a mudança repentina.
Ryunosuke, Layla, Anna e Luck, no entanto, apenas o encaravam, sorrindo e impressionados.
Assim, Dante atraiu oito dos projéteis disparados por Layla usando eletromagnetismo. Segurando cada um entre os dedos, ele moveu as mãos e os disparou, contra círculos mágicos que havia criado, e assim elas aceleraram, voando como disparos de railguns que cortavam o céu.
— Idiota! O que está fazendo? Você não vai acertar os alvos com disparos retos! Não aprendeu nada? — Kai gritou,
mas rapidamente ficou quieto ao perceber que os disparos de Dante não estavam totalmente retos; ele os movia um pouco, fazendo-os descrever curvas ao controlar suas trajetórias com eletromagnetismo.
— Ele está controlando as balas como Vivian controlou a tesoura?!!! — perguntou Chuya.
— Seu idiota, não percebeu? Ele não tem tanto controle delas como Vivian tinha! Ela conseguia controlar completamente a trajetória da tesoura, mas ele só tinha um controle superficial, como puxar a bala um pouco para um lado para ela fazer uma curva. Com um controle tão bruto, não vai conseguir acertar! — respondeu Kai.
— Está errado. Ele já previu isso e fez o próximo movimento… Esqueceu quantas balas ele pegou? — Beatrice falou pela primeira vez por vontade própria, sem ser questionada.
As balas voaram para além do alcance de seu controle eletromagnético de ether e aceleraram. Mas quando estavam prestes a colidir com obstáculos ou seguir por trajetórias erradas, de repente, chocam-se umas com as outras no ar, alterando seus cursos novamente.
— Isso é a análise e previsão de Layla… foi por isso que ele disparou oito projéteis! — Kurokawa falou, gritando, impressionada.
"Eu também vou ficar mais forte! Esse ainda não é o meu limite! Eu ainda posso ir ainda mais longe!"
Enquanto Dante sorria pensando isso, a explosão verde foi ouvida.
— Está brincando! Ele realmente conseguiu! — exclamou Chuya.
"Droga! Merda! Esse maldito! Aquelas duas mostraram feitos quase impossíveis de serem analisados, até ele tinha ficado sem acreditar. Mas ao ver que estava para trás, ele não parou de pensar. E não ficou apenas impressionado, achando que era algo que não podia fazer. Ele ficou pensando em que benefícios ter visto aquilo poderiam trazer e usou essas 'derrotas' para se fortalecer ainda mais, aprendendo com as duas e ficando ainda mais forte!" Kai pensava, irritado, enquanto roía a unha.
— Isso… Isso, Dante! Você ainda pode crescer ainda mais! Me devore ainda mais e fique ainda mais forte! — Layla sorria, completamente corada, vendo o quanto Dante havia evoluído.
— Agora eu entendi... era dele que Beatrice tinha contado quando voltou do Titanic. Agora entendi por que ela ficou impressionada… Scarlune Dante, né? Haha! Acho que você pode virar uma parede interessante para mim escalar! — Kintoki falou, sorrindo.
— Espera, ela ficou impressionada com ele…? Então foi por isso que ela não o atacou naquele dia em que os dois se trombaram nos corredores? Para Bea e Kin o acharem tão interessante… — Mio murmurava, também o encarando.
E assim, uma a uma, as outras chamas foram explodindo. Por fim, quando as quatro estouraram, Ryunosuke anunciou:
— Scarlune Dante conseguiu completar o terceiro teste com perfeição.
Enquanto isso, Dante estica o braço direito para cima com o punho fechado e gritava:
— Osu!
Parte 3
Assim, Ryunosuke foi até o centro mais uma vez.
— Bom, como puderam ver, três dos que tentaram já conseguiram a pontuação máxima no teste. Como não deixei claro antes, é bom que saibam: só resta mais uma vaga para os quatro melhores. Após essa vaga ser preenchida, mesmo que outra pessoa consiga destruir as 4 chamas, ainda assim será considerada uma pontuação inferior à dos quatro primeiros. O motivo é simples: os primeiros conseguiram suas pontuações antes e com menos informações que os demais. Quero deixar isso claro, principalmente para os idiotas que pensaram: 'Vou por último porque, usando o que vi dos outros, terei uma ideia de onde os alvos vão estar!'
Ryunosuke falava apontando para Kaiser, fazendo com que todos começassem a olhar para ele com um julgamento silencioso.
— Professor, dá para parar de apontar para mim?!
Assim que Kaiser começou a se mover, parecendo ter tomado a decisão de ir, foi interrompido por Shimura, que apareceu no centro antes dele, ajeitando os óculos no rosto com um dedo e respirando fundo, uma determinação incomum em seus olhos.
— Bom, vendo todo o esforço de meus colegas e o brilho da evolução do Mestre Dante, acho que é minha vez de me esforçar um pouco, degozaru!
Shimura falou, com uma voz firme, o que impressionou a todos, já que ele era outro dos que tinham tirado as piores colocações nos testes anteriores.
— Interessante... então o gordinho quer tentar? Acho que posso esperar — Kaiser falou com um sorriso condescendente, cruzando os braços, confiante de que não precisava se preocupar com ele.
Ignorando o comentário, Shimura ergueu um volume de mangá na mão esquerda, abrindo-o em uma página específica. Seus olhos fixaram-se nos painéis por um momento, e um brilho quase tangível de admiração – o "orgulho" de fã – começou a emanar dele.
— Vamos começar! — declarou.
Uma luz suave, como a de uma tela ligando, começou a vazar das páginas do mangá. Partículas de Éter multicolorido, vibrantes como tinta nanquim ganhando vida tridimensional, surgiram no ar ao redor de sua mão direita. Elas giraram e se moldaram rapidamente, solidificando-se em segundos numa arma que parecia deslocada da realidade: era grande, angular, com cores primárias vibrantes e linhas de contorno pretas e grossas, como se tivesse sido arrancada diretamente de uma vinheta de ação. A arma cartunesca zumbiu levemente, um som agudo e eletrônico, ao se conectar ao seu antebraço com um 'clique' suave e quase cômico.
Enquanto todos piscavam, tentando processar a aparição bizarra, Dante arregalou os olhos, reconhecendo o design imediatamente.
— Espera! Essa... essa é a forma arma do Protótipo da Nemesis?! Do mangá Go Romance Ru?
Dante perguntou, a voz carregada de incredulidade e excitação de fã.
Shimura sorriu, claramente satisfeito com o reconhecimento. Pequenas luzes no cano da arma piscam em sequência, como se confirmassem.
— Como esperado do Mestre Dante, reconheceu na hora, degozaru!
“O protótipo da arma senciente Nemesis lê meus pensamentos. Assim, uma vez que eu visualizo o alvo claramente, ela trava a mira no inimigo, independente de onde no universo ele esteja se escondendo. Graças ao professor, eu tenho uma boa ideia do formato das chamas e, por isso”
Shimura fechou os olhos por um breve instante, concentrando-se intensamente. A imagem mental das quatro chamas – seus formatos e essências distintas, tornando se nítida em sua mente. A arma cartunesca em sua mão emitiu um som eletrônico agudo e curto, quase como um "beep" de videogame confirmando um comando.
Sem qualquer hesitação aparente, sem alinhar a mira com qualquer direção específica naquele espaço caótico, Shimura pressionou o gatilho quatro vezes em rápida sucessão. Quatro disparos ecoaram, não com o estrondo de armas normais, mas com um sonoro e exagerado "Pew! Pew! Pew! Pew!", saído diretamente de uma onomatopeia de mangá. Quatro projéteis de Éter puro, luminosos e talvez até com pequenas estrelas de impacto estilizadas em suas pontas, emergiram do cano.
As balas não seguiram trajetórias retas nem por um nanossegundo. Ignorando completamente a física convencional ou a necessidade de ricochetes calculados que tanto impressionaram em Layla e Dante, elas se moviam pelo ar com uma velocidade espantosa. Contornaram pilares flutuantes, atravessaram arcos impossíveis e ignoraram as distorções espaciais com uma fluidez quase líquida, como se seguissem um caminho pré-definido e absoluto, traçado pela mira conceitual da Nemesis. Uma das balas fez uma curva de 90 graus instantânea para evitar uma parede espelhada; outra subiu verticalmente por dezenas de metros antes de mergulhar em direção a um alvo oculto no que parecia ser o chão abaixo. Era um tipo de precisão totalmente diferente – não era sobre cálculo ou controle fino do atirador, era a aplicação direta de uma regra de ficção sobre a realidade.
Em menos tempo do que levou para Kaiser processar o choque em seu rosto, os quatro projéteis atingiram seus destinos. Quatro pequenas explosões – azuis e verdes – floresceram quase simultaneamente em pontos distintos e distantes do labirinto. O som agudo das chamas se quebrando ecoou por um breve momento, seguido por um silêncio pesado e atônito da audiência. Shimura abaixou a arma, que ainda emitia um leve zumbido eletrônico. Um vapor quase imperceptível, com um cheiro que lembrava papel e tinta de manga, dissipou-se dela antes que a própria arma se desfizesse em partículas luminosas e desaparecesse. Ele então ajeitou os óculos novamente, um pequeno sorriso satisfeito no rosto, enquanto Ryunosuke já fazia suas anotações com uma sobrancelha arqueada.
Shimura Tendo
Habilidade: Fiction Pride
Shimura Tendo é um Gifted com a extraordinária capacidade de materializar objetos e artefatos diretamente das páginas de mangás que ele esteja fisicamente segurando. Ele constrói essas criações a partir de seu próprio Éter, trazendo elementos de suas histórias favoritas para o mundo real. A força e fidelidade da criação, no entanto, não dependem apenas do poder do item na obra original, mas crucialmente da intensidade da conexão emocional genuína – o "orgulho" e apreço – que Shimura sente pela obra e pelo item específico.
— Um poder bem criativo, tenho que dizer — comentou Ryunosuke, fechando seu bloco de notas.
— Incrível! Então é isso que o protótipo da Nemesis faz! Pô, eu tomei um super spoiler de Go Romance Ru, mas, caraca, foi tão incrível que eu nem ligo!
Dante gritou, olhando admirado para Shimura, que apenas deu de ombros e caminhou de volta à sua posição inicial.
É quando o peso da situação atinge os demais: a quarta e última vaga para a pontuação máxima havia sido preenchida, e de forma tão rápida e inesperada. Um murmúrio percorreu o grupo. Assim, os outros, um a um, começaram a fazer o teste, agora sem a pressão de alcançar o topo, mas ainda sob o olhar avaliativo de Ryunosuke. Kaiser, em particular, ficou para trás, remoendo o erro de ter subestimado Shimura, sua confiança anterior completamente abalada. Conforme os outros alunos foram finalizando o teste, os últimos colocados acabaram sendo: Sophi, Mirai, Kurokawa e Kagura, que não acertaram nenhuma das chamas.
— Bom, agora vamos para nosso último desafio — anunciou Ryunosuke.
O ambiente ao redor deles ondula e se dissolve mais uma vez. Desta vez, porém, um suspiro coletivo de resignação, e não de choque, percorreu o grupo; eles já estavam se acostumando ao bizarro balé arquitetônico dos testes. Contudo, mesmo a familiaridade com o impossível não os preparou totalmente para o que surgiu.
Viram-se suspensos no ar, não sobre uma cidade, mas sobre um organismo arquitetônico colossal que se estendia até onde a vista alcançava: um Labirinto Vivo. As paredes eram uma tapeçaria de pesadelos e maravilhas: seções de pedra antiga cobertas por esculturas gregas clássicas, árvores imensas e antigas que pareciam perdidas no tempo, insetos presos em âmbar. Outras paredes pareciam feitas de pura biomassa, com veias escuras que latejavam ritmicamente e se conectam a estruturas de luz solidificada, formando pontes e passarelas precárias sobre abismos de escuridão cintilante. Acima de tudo, um céu azul brilhante e perpétuo era pontilhado por nuvens brancas.
A flora era igualmente alienígena e hostil: videiras com espinhos afiados como obsidiana subiam pelas paredes, ocasionalmente chicoteando o ar; árvores feitas inteiramente de cristal multifacetado emitem dissonâncias harmônicas que agridem os ouvidos e distorciam a luz ambiente; e imensos fungos bioluminescentes pulsava em tons neon venenosos, projetando sombras dançantes que alteravam a percepção das distâncias e escondem perigos. Algumas criaturas pareciam insetos gigantes que caminhavam deixando rastros de um muco ácido que corroía as pedras pelo caminho. O próprio ar vibrava com uma cacofonia de sons estranhos: cliques quitinosos, sussurros que pareciam vir de lugar nenhum. Era uma fauna estranha; o lugar evocava a imagem de um Éden distorcido, mas os perigos que escondia remetiam ao puro inferno.
Os caminhos do Labirinto atravessavam essa fauna inexplorada, retorcendo-se em ângulos que desafiavam a física euclidiana. Escadas levavam a becos sem saída que definitivamente não estavam lá segundos antes, e o chão sob os pés podia, sem qualquer aviso, tornar-se vertical, transformar-se em areia movediça luminescente ou simplesmente desaparecer sobre um fosso de sombras famintas. Era um lugar projetado não apenas para confundir a direção, mas para agredir os sentidos, testar a sanidade e punir a hesitação.
— O próximo e último desafio será... uma corrida — Ryunosuke falou, sua voz calma contrastando fortemente com a visão caótica e ameaçadora abaixo.
— Mas entendam, será muito mais difícil que uma simples prova de velocidade. Este labirinto testará não apenas sua rapidez, mas sua inteligência espacial, sua memória, sua capacidade de adaptação e, crucialmente, suas habilidades de combate e sobrevivência. O objetivo é simples: atravessem esta estrutura e cheguem ao ponto de saída marcado do outro lado. Apenas aqueles que conseguirem alcançar o objetivo final vencerão. Os quatro primeiros a chegar receberão a pontuação máxima. Pois bem... Que comece a caçada!
Após dizer isso, Ryunosuke fez um gesto displicente com a mão. O chão invisível sob os pés dos participantes desapareceu abruptamente, e eles foram lançados do céu como meteoros individuais, cada um caindo em um ponto de partida distinto e aleatório dentro da imensidão labiríntica. A estratégia era clara: dificultar ao máximo a formação de alianças pré-existentes logo de início, forçando encontros inesperados – e potencialmente hostis – entre eles e com quaisquer horrores predatórios que o labirinto abrigasse.
E assim, o último e mais difícil desafio de Ryunosuke teve início.
Parte 4
No universo, fenômenos inexplicáveis tendem a acontecer. Desde a descoberta do éter, as pessoas do mundo começaram a notar que coisas que acontecem à sua volta, às vezes, fogem da lógica que deveria reger o mundo. Coisas que desafiam as leis da física, coisas que nos fazem questionar a existência e, por vezes, o motivo de estarmos vivos. O éter: a energia da alteração.
Para as pessoas de Gaia, que seguem forte e fielmente a religião, o éter é um erro, um defeito deixado na perfeição criada por Deus. Um fenômeno criado pelo Diabo para corromper os humanos, fazendo-os cair em tentação e, assim, usando-o para distorcer o maior presente de Deus: o mundo em que vivemos. Supostamente, todos aqueles que usam esse poder e alteram a realidade estariam corrompendo o maior presente de Deus e, por isso, seriam vistos como hereges.
Para a ciência, que não se prende a visões tão simplistas, isso não passava de superstição, acreditando que era apenas loucura, dita para encobrir as atrocidades cometidas em Gaia. O que fez com que a maioria dos outros reinos nunca realmente se importasse com essa visão. No entanto, mundo afora, o éter foi usado para criar coisas desumanas e horríveis, fazendo com que muitos, cegos por esse poder, brincassem de ser deuses. O éter abriu portas para crimes que antigamente poderiam ser vistos como os maiores tabus da humanidade: através do éter, vidas foram criadas, clones, experimentos humanos, criação de quimeras, genocídios, guerras e diversas outras atrocidades sem igual. Embora não desse para culpar diretamente o éter, não havia como negar o fato de que foi ele quem abriu as portas para muitas pessoas fazerem tais coisas hediondas.
— “Dê poder ao homem, e descobrirá quem ele realmente é.”
Uma frase dita pelo filósofo Nicolau Maquiavel explica facilmente os acontecimentos desencadeados por conta do éter. Apesar de ele não ter gerado propositalmente nenhuma das diversas tragédias, foi ele quem permitiu aos humanos fazê-las, por agora terem o poder para tal. Muitos, vendo como a visão das pessoas de Gaia não estava totalmente errada, viajaram para sua terra, acreditando no que era pregado, enquanto outros ao redor do mundo continuaram a ignorar, chamando a fé louca dos habitantes de algo totalmente irracional.
— "Uma faca na mão de um cozinheiro pode fazer maravilhas e, na mão de um assassino, pode matar."
Assim, a visão do mundo sobre o éter se dividiu em duas faces: aqueles que acreditavam que a existência do mesmo era a responsável por toda a miséria que assolava o mundo, sendo a semente do pecado deixada pelo Diabo para ajudar os humanos a se destruírem; e aqueles que acreditavam que o éter era apenas mais um fenômeno da natureza, sem um propósito claro, mas que poderia ser usado tanto para o bem quanto para o mal, dependendo de quem o usasse.
Essa visão durou por bastante tempo desde que foi pregada, e o mundo ficou dividido. No entanto, por volta dessa época, um fenômeno ainda mais bizarro e estranho aconteceu, fazendo com que os dois lados parassem de conseguir definir facilmente o que era o éter: uma alteração espontânea.
Embora ninguém tivesse definido como verdade, o mundo vivia sob uma crença: a de que o éter só estava lá para ser usado. Fossem os religiosos, que acreditavam que a semente do Diabo foi deixada para os humanos, eram os cientistas, que acreditavam que ele não passava de energia que só existia e só podia agir quando usada através da vontade de outra pessoa. No entanto, tudo isso mudou no ano de 16850, quando, sem explicação, uma espada acabou ganhando consciência e, assim, ganhou vida.
Aquele acontecimento impactou o mundo de forma completamente inesperada. Os religiosos, que tinham certeza absoluta de algo, pela primeira vez tiveram dúvidas:
— “Aquele poder deu vida a partir do nada, o maior feito de Deus... Então, aquele poder não poderia ser uma extensão Dele próprio?”
Assim como os próprios cientistas tiveram que rever tudo em que acreditavam: se o éter, que já existia por aquele mundo há tanto tempo, podia se alterar por vontade própria, como dava para dizer o que realmente era real? Quais leis daquele mundo realmente eram as leis originais e quais eram subprodutos de alteração?
— “E se o éter tiver vontade própria, estamos mesmo usando ele, ou é ele quem estaria nos usando?”
Aquele foi o momento em que a divisão exata que existia no mundo se dividiu ainda mais e se fragmentou, criando religiosos que viam o éter como um milagre, aprendendo a conviver com ele como mais uma das obras de Deus, enquanto também houve cientistas que abominam aquele fenômeno inexplicável, que parecia zombar do próprio conhecimento e entendimento. O mundo já não era mais preto e branco; não havia uma verdade tão simples quanto todos achavam. A partir daí, novas perguntas surgiram, e o mundo nunca mais foi o mesmo, assim como uma nova verdade foi exposta:
— “O éter é a própria alteração. Tudo que é constantemente banhado por ele está sujeito a mudar, seja vivo ou não, seja proposital ou não: as pedras, o metal, os animais e os seres humanos.”
Quando essa lei foi estabelecida, diversas novas pesquisas foram realizadas, tentando descobrir o que mais de errado poderia ter sido causado por uma alteração espontânea. E foi assim que foi descoberta a verdade sobre aquele mundo:
— “O Planeta que habitamos nem deveria existir.”
Em 17250, cientistas, ainda em busca de alterações espontâneas, perceberam algo que mudou novamente a visão de tudo em que os humanos acreditavam: o planeta em que viviam, nomeado de Hortus Parvus, nunca deveria ser capaz de existir de acordo com as leis da física normais. No entanto, lá estavam todos os humanos, habitando-o e contrariando tudo isso.
Naquele planeta era exibida uma complexa divisão em quatro grandes domínios: Gaia, Elysium, Alexandria e Umbra. Diversas evidências geológicas sugerem que cada um desses domínios corresponde a supercontinentes primordiais, semelhantes a Pangeas múltiplas, cuja fragmentação resultou na atual configuração continental. Apesar da sofisticação tecnológica das civilizações locais, Hortus Parvus sempre permaneceu um mundo parcialmente inexplorado. Sua magnitude, comparável à de uma estrela anã vermelha, desafia as teorias planetárias convencionais. Jamais um planeta de tal proporção é completamente habitável deveria sequer existir.
Para resolver o caso impossível, diversas análises espectroscópicas e gravimétricas foram realizadas, revelando que o núcleo planetário é composto predominantemente por éter. Foi quando se percebeu que o éter nuclear gerava um campo gravitacional singular, capaz de manter a coesão da massa planetária colossal. Além disso, a presença de éter parecia conferir ao planeta características de um sistema vivo autônomo.
O que fez com que os humanos percebessem, pela primeira vez, o quão pequenos e insignificantes eram. Hortus Parvus, o planeta em que eles viveram por tantos anos, exibia padrões de atividade geológica e atmosférica em um nível de autorregulação. O próprio planeta respondia a estímulos externos e internos, o que fez com que todos percebessem que o próprio Hortus Parvus estava vivo. E o único motivo de todos estarem vivos não passava de pura sorte, uma vez que eles só estavam lá porque o próprio éter alterou o planeta, dando-lhe vida e permitindo que aquele planeta existisse, assim como os seres vivos que lá habitavam. Assim como minúsculos ácaros que vivem nos pelos dos cachorros, todos os humanos e seres vivos não eram diferentes de minúsculos insetos que caminhavam pelo planeta.
Quando os humanos viram o quão pequenos eram e quão superficial poderia ser a vida, uma espécie de barreira na razão humana foi quebrada, levantando perguntas que antes pareciam delírios filosóficos sem sentido, mas que agora eram perguntas que até mesmo os físicos querem entender:
— “O que é a vida?”
— “O que é a alma?”
— “O que prova que eu realmente existo?”
— “Qual o sentido de viver?”
Os humanos não são os seres que dominam esse mundo, nunca foram e nunca serão. Por mais que ajam, pensem, trabalhem e se esforcem, suas vidas continuarão sem um propósito; fenômenos inexplicáveis continuarão a aparecer, e todos os mistérios daquele mundo nunca serão descobertos. A chama que os humanos usavam para se aventurar pelo desconhecido, a chama do conhecimento, parece cada vez menor. O medo cercou o mundo. O marco que deveria simbolizar a saída do mundo da Era das Trevas, o Iluminismo, nunca aconteceu, pois não importava o quanto fosse estudado, a ciência jamais poderia responder a todas as perguntas que existiam, e sempre que uma fosse respondida, novas surgiriam.
Pois o processo do éter não tornava apenas as coisas à volta sem explicação; aos poucos, estava alterando ainda mais aquele mundo já bizarro. Assim como o universo continuava a se expandir sem um fim aparente, o planeta estava a crescer como um ser vivo. Ao redor do mundo, novas coisas estavam sendo criadas e alteradas, novas leis surgiam, e mais e mais o sentido do mundo parecia se perder. Aqueles que, ainda assim, não desistiram e continuaram a levantar perguntas, arriscando suas vidas em busca de continuar essa busca incessante e infrutífera, foram aqueles que ganharam o verdadeiro título de 'Caçador'.
Assim, a Era da Caçada ao Desconhecido nasceu e reinou sobre o mundo até os dias de hoje, quando, finalmente, um novo ser, gerado de forma espontânea, nasceria e, mais tarde, seria ele quem novamente colocaria em xeque tudo o que entendemos do mundo.
Aquele labirinto vivo, criado por Ryunosuke em sua Black Box, era uma réplica de parte do planeta, uma dungeon. Ele o havia copiado para que fosse mais um dos mundos exploráveis por sua habilidade e um local para que pudesse treinar seus alunos. No entanto, Ryunosuke nunca percebeu o erro que cometeu: no local original de onde copiou o labirinto, um evento espontâneo estava lentamente ocorrendo.
Uma árvore velha e antiga possuía raízes que se expandiram por todo o labirinto. Ela estava viva há milênios e fora espectadora de diversos acontecimentos, registrando tudo em suas raízes através do ether que absorvia, assim como do sangue que manchava aquela terra, derramado ali ao longo do tempo.
Aquele labirinto, registrado como uma dungeon de Rank S existente em Alexandria, foi um local que testemunhou inúmeros eventos: guerras travadas em suas planícies, mortes de humanos e monstros em constante luta pelo território, e o ciclo incessante e aparentemente sem sentido de nascimento e morte. Diversos tipos de sofrimento mancharam o solo, e esse sofrimento foi absorvido e registrado pelas raízes da árvore.
Demoraria milênios para que esse ether absorvido resultasse em algo concreto. Contudo, Ryunosuke, ao copiar e replicar tudo em sua Black Box – um universo de bolso gerado por ether –, acelerou inadvertidamente a evolução daquele fenômeno. Cada vez que ele abria aquele local replicado, o processo se intensificava.
E naquele momento, enquanto os alunos atravessavam o labirinto na Black Box, a árvore finalmente começou a se alterar de forma espontânea. De suas raízes, um novo ser vivo era gerado. Criado a partir da árvore e seu ether – e semelhante aos humanos, os seres cujo sangue mais fertilizou suas raízes –, uma criatura completamente nova nascia e começava a abrir seus olhos.
Parte 5
Dentro do labirinto, em uma das áreas afastadas, uma garota corria através de uma ponte de pedra coberta por grama. O labirinto, escuro e estreito, era envolto por uma névoa fraca, que dava uma atmosfera fria e úmida ao local. Enquanto corria, vários insetos gigantes perseguiam a garota, como se estivessem a caçando. Centopeias gigantes se moviam por cima e por baixo da passarela, enquanto os escorpiões avançavam em conjunto. De repente, a garota, que corria parecendo lutar por sua vida, salta para cima, impulsionando-se pelas paredes naturais do labirinto. Ela salta por cima das criaturas e começa a matar os insetos com facilidade. De sua mão direita, uma enorme espada surge e, usando-a, ela facilmente corta a carapaça das criaturas. Com extremo domínio de sua espada larga, conseguia se defender das patas e presas dos insetos enquanto ainda se movia agilmente, cortando-os. Demonstrando um incrível controle, ela era capaz de pressentir até mesmo a intenção assassina dos insetos sob o solo que tentavam atacar, mas assim que apareciam, eram divididos.
— É melhor eu ir logo.
Nesse momento, ela salta para a frente, de onde saía um lagarto enorme tentando devorá-la. Com frieza nos olhos, como se o lagarto não a incomodasse nem a tivesse surpreendido, ela move sua espada e corta a criatura, aterrissando ao lado dela.
— Caraca, você cortou ele sem nem hesitar, mesmo sendo pega de surpresa! A voz de outro garoto veio de seu lado.
A garota começa a olhar em volta quando percebe Dante próximo a ela. Assim, ela rapidamente começa a segurar o cabo de sua espada, e Dante salta para trás, notando como ela ainda permanecia com aquela feição fria, encarando-o.
“Tá, talvez me mostrar não tenha sido a melhor das ideias. Será que ela vai tentar me cortar também?” Dante pensava, encarando a garota com atenção.
— Rooonc
De repente, Dante escuta um som estranho e começa a procurar a origem dele.
— Ei, você ouviu isso? — Dante perguntou para a garota, quando notou que ela havia ficado vermelha e começou a tapar a barriga com a mão.
— Não vai me dizer que você...
— Sim, eu ronquei porque estou com fome! Vamos lá, pode rir. Eu vou bater tanto na sua cabeça que você nem vai mais lembrar disso, então aproveite para rir enquanto pode. — a garota, quieta até então, começou a falar muito e rápido de repente, surpreendendo Dante, que não esperava por aquela resposta.
— Relaxa, eu não vou rir. E digo mais: talvez eu tenha a solução para os seus problemas. Então, que tal tirar a mão da espada? Se eu não conseguir resolver como prometo, você ainda pode me arrebentar como estava dizendo. O que acha?
— ..., tá certo. Mas saiba que, se estiver tentando me enganar, eu vou partir sua cabeça sem hesitar.
Algum tempo se passa após isso e agora uma grande fumaça sobe do local onde eles estavam. Apesar de não ser uma ideia realmente sensata, já que estavam entregando sua posição, Dante havia feito uma fogueira ali. Normalmente, Ludmilla teria rejeitado a ideia, mas agora a garota estava se deleitando com a carne assada e o ensopado que Dante havia preparado.
— ... Pelo visto está bom, né? — Falava Dante com um sorriso arrogante.
— Tá muito bom, obrigada. — A garota respondeu.
— Por essa eu não esperava.
— O que estava achando? Que eu ia dizer algo como “Dá pro gasto”?
— Bom…
— Masoquista.
Dante percebeu que a intenção da conversa havia se perdido em algum ponto, pois não esperava ser chamado de masoquista. Mas, sem vontade de abrir uma nova discussão, ele apenas ignora, enquanto olhava de relance para a garota, pensando como ela foi uma das que não havia feito nenhum movimento durante os testes anteriores.
— Smettila di guardarmi in quel modo, maledetto pervertito.
— Eu não entendi bem o início dessa frase, mas pelo jeito que ela terminou, tenho certeza que você estava me xingando, hein!
A garota começou a encarar o outro lado, como se estivesse ignorando completamente o que ele havia falado.
— Tá certo, tá na hora de voltar a caminhar. Você vem comigo. Pelo que eu vi do labirinto, ele não foi feito para ser terminado em um único dia, mas eu quero chegar antes de todos, então caminharemos durante a noite também.
— Oh, e o que eu ganho indo com você?
— Tsk, oltre a poter camminare con me e guardarmi senza che io lo faccia a pezzi, questo pervertito vuole ancora una ricompensa?
— Dá pra falar de um jeito que eu consiga entender? ... E eu sei que pervertito significa pervertido, sabia!
— Se sabe, descubra o resto sozinho também. De qualquer forma, você já ganhou a terceira fase do teste, o que quer dizer que não tem que se preocupar tanto com este teste.
— Sim, eu ainda preciso…
— Por quê?
— Eu não estou fazendo isso só porque quero algum benefício. Eu preciso ficar mais forte o mais rápido possível, então não vou parar agora só porque estou livre de aulas extras. Vou continuar mirando no topo, sem parar.
— Entendi. In effetti è un modo di pensare carino. Bom, sendo assim, vamos logo. Comigo, além de chegar primeiro, o que não vai faltar são batalhas para que você consiga ficar mais forte. E sempre que eu ficar com fome, você fará a comida. Agora, vamos parar de perder tempo. — Ludmilla falava enquanto se levantava e começava a correr por outro dos corredores do labirinto.
— É sério? Ela só decidiu que eu iria segui-la e pronto? Mas o que foi que ela falou naquela última frase?
Assim, Dante a seguiu, e ambos voltaram a atravessar o labirinto vivo.
Parte 6
Já em outro ponto do labirinto, um grupo formado por Chuya, Anna e Mio caminhava pelo labirinto verde, após se reunirem.
— Mas que droga, hein! Se a gente já tivesse se encontrado com o Miguel, com certeza já teríamos terminado isso.
De repente, enquanto Chuya falava, um lagarto enorme, parecendo um dinossauro, surgiu ao virar o corredor e os atacou.
— Droga! — Chuya falou, enquanto saltava para trás junto de Anna.
Mio, que ficou lá parada, deixou o lagarto vir até ela. Soltando um sorriso, colocou sua mão na frente da boca do lagarto, deixando-o morder. Assim, quando ele fechou a boca tentando morder o braço de Mio, o monstro se viu incapaz.
— O que foi, lagartixa? Não gostou do aperitivo?
Mio falava, ainda sorrindo, enquanto seu braço havia se transformado em algo como metal.
— Um, dois, TRÊS!
Enquanto Mio falava, ela moveu o outro braço, também o transformando no mesmo material semelhante ao metal, e socou a cabeça do lagarto. Isso o fez abrir a boca, gritar de dor e se afastar. Já Anna, que havia se afastado, transformou seu braço em um canhão que disparou uma rajada de éter, lançando o dragão para trás. Enquanto Chuya, que estava esperando com o cigarro aceso na boca e a katana de chamas no ombro, o atingiu como um rebatedor de beisebol acertando uma bola. Mas, ao invés de lançá-lo para frente, cortou o lagarto ao meio sem nem derramar uma gota de seu sangue, uma vez que a ferida instantaneamente se cauterizou por conta do calor da espada.
— Pelo visto, este local tem uns animais bem diferentes. — Anna falou, juntando-se aos três na frente do lagarto.
— Bom, não parecem ser perigosos, mas ainda seria mais fácil se a gente pudesse só ignorá-los e ir direto para a saída. — Chuya continuava reclamando.
— Ei, essa sua habilidade... você transformou o seu braço em um canhão? — Mio perguntou, olhando animada para o braço de Anna.
— Huh? Não, eu não transformei meu braço. — Anna retirou o braço de dentro do canhão que se formou em volta dele.
— Entendi. Então seu poder cria coisas. Nossa, que conveniente!
— Mas ou menos... ele sempre acaba me deixando cheia d- ronc
Enquanto falava, o estômago de Anna começou a roncar, deixando-a completamente vermelha e envergonhada.
— Relaxa, eu sei bem como é. — Mio falou, retirando uma barrinha de cereal e jogando para Anna.
Enquanto comiam, Chuya olhava para as duas, sentindo-se de fora da conversa.
— Ei, dá pra não ignorar que eu estou aqui!
— Calma, se quer uma, eu dou.
Mio jogou uma para Chuya também, que abriu e começou a comer. Mas assim que deu a primeira mordida e engoliu, sentiu-se tão cheio e estufado que quase teve vontade de vomitar.
— Mas que merda é essa?! Eu mal comecei e já estou tão cheio que vou morrer!
Chuya começou a encarar aquilo, vendo nas informações e notando que aquela barra de cereais tinha mais de quarenta mil calorias em um único pacote.
— Droga, merda… eu vou morrer! Você me matou, ruiva maldita!
— Eu só te dei porque parecia que você queria. Não é culpa minha se você comeu sem ler.
— Para piorar, você não está nem negando o fato de que eu vou morrer, né, maldita?! Merda... eu vou morrer antes de poder aproveitar uma vida sem incômodos, dormindo em uma rede à tarde toda, curtindo o vento da tarde, sem nunca mais ter que trabalhar! É isso que acontece com aqueles que perseguem seus sonhos? Eu vou morrer por uma barra de cereais! — Ele continuava se contorcendo de dor no chão, enquanto lágrimas apareciam em seus olhos.
— Se você chama isso de sonho, devia morrer logo mesmo. — Mio continuava a encará-lo de cima, mas agora com olhos cheios de desprezo.
Mas, enquanto os dois continuavam conversando e brincando, Anna, comendo sua barrinha de cereais, começou a encarar o horizonte. Bem à frente, em uma das partes distantes do labirinto, estava uma gigantesca montanha. Ela não era a saída, apenas o centro do labirinto – algo que todos conseguiram ver enquanto caíam ali. Isso significava que não havia motivos lógicos para ir até lá. Ainda assim, algo parecia chamar a atenção de Anna, algo que só poderia ser nomeado como Instintos. Estes pareciam dizer que aquela montanha não deveria ser ignorada.
— Ei, de acordo com ele, parece que nosso companheiro vai morrer. O que acha de deixarmos ele aqui?
Mio falou, encarando Anna, quando percebeu sua atenção direcionada para a montanha.
— O que foi? Quer ir até lá?
— … não é bem isso. Apenas estou tendo uma sensação estranha vinda de lá.
— Bom, sendo assim, por que não vamos? De qualquer forma, a gente já passou em provas anteriores, então não devemos ficar em último. — Chuya falou, entrando na conversa das duas, ainda deitado no chão.
— Pode ser… se vocês não veem problemas.
Assim, o grupo de Mio, Anna e Chuya mudou sua direção, desistindo da ideia de seguir até a saída e indo direto até a montanha. Ainda assim, enquanto caminhavam, algo incomodava profundamente Anna. Algo lhe dava uma sensação estranha, como a de uma agulha perfurando seu coração – uma dor estranha e desconcertante. Talvez seus instintos quisessem dizer algo, mas ela não era capaz de entender. Contudo, aquela dor não podia ser ignorada; incomodava-a demais para isso.
“Mas será que ir até a fonte desse incômodo é realmente a melhor ação a se fazer?”
Enquanto se perguntava isso, Anna e o grupo continuavam caminhando.
Parte 7
— Você acha que ele chegou? — Perguntava Kurokawa.
— Eu não tenho ideia. — Respondia Kagura, apertando os olhos.
Pouco tempo antes, outro grupo havia se formado, composto por Kurokawa, Kagura e Abel. Eles acabaram sendo mandados para próximo da maior montanha daquele labirinto e tiveram a ideia de escalá-la para ter uma noção do melhor caminho até a saída. Mas, quando se encontraram, decidiram trabalhar em equipe, uma vez que isso foi proposto por Abel, o mais forte até então. As duas não viram motivos para recusar. Assim, ele saltou, indo em direção ao topo, dizendo que veria a melhor rota, já que seria mais prático do que os três subirem toda aquela montanha.
Já no topo dela, Abel teve uma sensação estranha vinda de dentro de uma enorme e antiga árvore. Ela parecia emanar vida; as folhas e galhos, apesar de velhos, transbordavam de folhas novas e verdes e de um poder vital sem igual. Assim, Abel foi se aproximando dela para investigar, esquecendo-se de sua missão original. Quando chegou até o centro da árvore, teve uma vista que nunca esperou ou sequer imaginou vislumbrar: uma mulher nua, com seus cabelos longos tampando os seios e com folhas das árvores sobre suas pernas como um lençol. À sua volta, vários monstros, animais, insetos e outras espécies estavam deitados, como se estivessem ajoelhados frente à garota. Mesmo as mais selvagens e brutais das criaturas estavam lá, completamente dóceis. Os lagartos carnívoros estavam tão quietos e calmos que a garota podia facilmente tocá-los sem que reagissem.
Então, a garota se levantou, demonstrando uma beleza sem igual, e caminhou até um lobo enorme que se deitou de lado, como se estivesse se entregando a ela. Assim, ela enfiou sua mão no corpo dele de forma delicada e bela, tão suavemente que parecia que, mesmo sendo aberto e tendo suas tripas arrancadas, o lobo não sentia nada.
Misericórdia.
Era a palavra que facilmente descrevia aquela cena e a única coisa que passou pela cabeça de Abel, que observava sem entender tudo aquilo. A garota comia a carne e os órgãos ensanguentados do lobo, mas, apesar de se manchar de vermelho, aquela visão não passava a sensação perturbadora e horripilante que deveria. Os animais não se sentiam incomodados; até mesmo o lobo morto parecia ter uma feição de paz e alegria. Mesmo para Abel, que não conseguia entender, a calma e a paz que aquela imagem transmitia eram grandes o suficiente para fazê-lo chorar.
O Jardim do Éden.
Foi aquilo que a mente de Abel conseguiu retirar de toda aquela visão. Mas, à medida que via tudo aquilo como puro e sagrado, seus batimentos cardíacos aceleraram, sua ansiedade aumentava, seu desconforto crescia. Mas não com a vista à sua frente, e sim consigo mesmo. Ele começava a perceber o quão impuro ele era, como um ser hediondo, algo que buscava a violência, algo horrível.
Caindo de joelhos no chão em lágrimas, ele se repudiava. Visões de tudo e todos que ele matou até aquele dia passavam por sua mente, enquanto sentia seu corpo coçando; seu rosto, tudo nele, parecia sujo e imundo, podre e corrupto. Só o fato de ele estar naquele lugar era repugnante, pois sabia que estava manchando aquele ambiente belo e perfeito.
Assim, ele escutou passos indo em sua direção. À medida que se aproximavam, uma calma e paz atingiram sua alma, e ele finalmente começou a parar de coçar seu rosto. A visão angelical e bela da garota fez com que todas as suas preocupações, medos e temores desaparecessem.
A garota, que chegava em frente a ele sendo seguida pelos animais, começou a estender sua mão. Abel não queria ser tocado, não queria manchar mãos tão puras sendo tocadas por alguém tão impuro, mas a garota só sorria gentilmente, e ele aceitou, como se quisesse fazer tudo para alegrar aquele ser.
Assim, a garota tocou gentilmente seu rosto e fez carinho nele. Aquelas mãos eram tão puras que ele sentiu estar sendo tocado por um anjo. Enquanto as mãos dela deslizavam sobre ele, ele era purificado, limpo; todos os seus medos sumiram, toda a sua dor, seus arrependimentos e desejos egoístas. Ele era preenchido de pura felicidade.
Enquanto as mãos se moviam pelo corpo dele, Abel sentia sua alma ressoar com aquele jardim. Enquanto as mãos dela faziam carinho nele, ele atingia o prazer eterno. Enquanto ela o abria e seu sangue derramava, ele sentia a verdadeira felicidade, percebendo que se juntaria àquele lugar belo e sagrado, fazendo parte dele.
Agradecimento.
Abel estava preenchido por esse sentimento caloroso, puro e belo. Ele estava verdadeiramente feliz: agradecido por seus pais por terem lhe dado vida; agradecido por todos que cruzaram seu caminho; por todas as dificuldades e provações que o ajudaram a chegar até onde estava; e agradecido por aquela garota, aquele ser que lhe concede sua misericórdia e o salvou.
Uma luz banhava aquele local, iluminando o corpo aberto e ensanguentado de Abel, enquanto suas carnes e entranhas eram lentamente devoradas pela figura angelical.
Já embaixo da montanha, Kurokawa começava a se questionar:
— E se tivesse acontecido algo com ele? Vamos ficar aqui só esperando?
— Faremos assim: caso ele não volte nos próximos 10 minutos, vamos ignorar e subir. Talvez ele não esteja achando a melhor rota, ou talvez ele até tenha seguido na nossa frente. Mas não precisa se preocupar. Você viu a luta dele contra o Kintoki, né? Ele não é do tipo que ficaria tão quieto caso realmente tivesse problemas.
— Acho que você tem razão.
Assim, elas continuaram ali paradas, esperando, sem nem imaginar o que as aguardava no topo daquela montanha.
Parte 8
Dante e Ludmilla continuavam avançando em direção ao final do labirinto, e mais criaturas e monstros apareciam. Agora, o labirinto parecia uma antiga cidade abandonada, coberta pelo verde da natureza: prédios antigos caídos, cheios de musgos e árvores. Mas não dava tempo para eles apreciarem toda a paisagem desolada e antiga, pois sempre que cuidavam de uma criatura, uma maior aparecia, como os lobos gigantes que os perseguiam, goblins, esqueletos, insetos, entre outros.
— Droga, olha só esse exército atrás de nós!
— Não perca tempo pensando neles. Algo bem maior está chegando.
— Espera, como assim, maior?
E, de repente, um enorme e gigantesco urso saiu do meio da terra.
— Mas que mer-
Mas, antes de Dante continuar falando, Ludmilla liberou as correntes que estava carregando consigo. Elas começaram a se comportar como cobras, mas podiam se mover até pelo ar. Assim, deram voltas pela sua cintura e, quando prenderam no corpo do urso, a puxaram, fazendo-a saltar em alta velocidade pelo ar. As correntes voltaram, e ela saltou por cima do urso. Encarando-o do céu, ela desceu com um corte bem no pescoço do animal.
Ainda assim, não o atravessou completamente. O urso tentou, em desespero, atacá-la, mordendo antes que ela terminasse de decapitá-lo. Mas, antes de atingi-la, ela foi puxada por suas correntes, que se movem sozinhas, prendendo-se no prédio e puxando-a para trás. O sangue do urso derramava, cobrindo o chão, enquanto ela continuava encarando-o e murmurava:
— Não queria desperdiçar éter com uma coisa dessas, mas...
Assim, ela fechou seus olhos antes de abri-los novamente. Agora, seus olhos vermelhos apresentavam duas pupilas em forma de X. Novamente, suas correntes foram na direção do urso, que tentou se afastar e dar uma patada nela. Seus movimentos eram tão pesados que faziam todo o chão tremer, desequilibrando Dante, que corria de um exército de monstros. Mas Dante percebeu que o mesmo se aplicava aos monstros também.
Assim, ele usou o eletromagnetismo para se estabilizar no chão, virou-se e, no momento do próximo movimento do urso, quando o chão tremeu e os monstros que o seguiam se desestabilizaram, Dante começou a disparar uma rajada de tiros de éter, aproveitando a abertura para destruir suas cabeças. Assim que voltou a olhar o urso, pensando em ir ajudar Ludmilla, ficou de boca aberta ao ver a garota dividindo o enorme animal horizontalmente em um único corte.
— O quê?!!
Enquanto as correntes se estendiam na direção de Dante, prendendo-se ao chão, ela era puxada, voltando até ele. Ao aterrissar, estava ofegante e esgotada, além de seu éter ter ficado pela metade. Dante correu até ela. A garota, puxando-o pelo colarinho, aproximou-o de seu rosto, apontou para o urso e assim falou:
— Comidaaaa, agora!!
Dante, com uma cara pálida e sem entender, teve que deixar sua curiosidade para outra hora, ajudando-a a sentar enquanto ia procurando coisas para fazer outra fogueira. E assim, mais um tempo se passou.
Novamente, em volta da fogueira, Dante começava a encarar a garota, perguntando-se como ela havia feito aquilo, quando ela percebeu e falou:
— Smettila di guardarmi in quel modo, maledetto pervertito.
— Que isso, déjà vu?!
— Huh? Afinal, como você consegue cozinhar tão bem? Achei que a carne daquele urso ficaria com um gosto forte por causa do cheiro.
— Eu vi muitos animes de culinária, aí sempre fiquei com vontade de aprender a cozinhar. Por isso, acabei aprendendo alguns truques. E aí, ficou impressionada?
— Claro! Aposto que você vai ser uma boa esposa.
— Ei!
Os dois começaram a comer enquanto Dante analisava o corte do urso de longe. Além de um corte incrível, foi extremamente preciso, mas isso só o deixava com dúvidas: se a faca dela tinha um fio tão bom, por que ela não conseguiu cortar o pescoço dele antes?
— Essa foi a sua habilidade?
— … Tipo isso. Foram os meus olhos, para ser mais exato.
— Olhos? E...
De repente, uma faca voou na direção de Ludmilla, mas ela se defendeu com as correntes, que se moveram para protegê-la.
— O que é isso agora?
— Eu não sei, mas tinha que aparecer logo agora para atrapalhar a minha refeição?
E então, das sombras do labirinto, caminhando com um sorriso perturbador no rosto vermelho e corado, surgiu Layla.
— Droga, logo você tinha que aparecer.
— Amiga?— Ludmilla perguntava para Dante
— Uma velha... conhecida.
— Assim você me magoa, Dante.
De repente, Layla avançou até eles em alta velocidade, movendo as mãos nuas. Ao tocar os corpos de ambos, cortou-os e cobriu as mãos de vermelho.
— Porcaria!!
Dante gritou sem entender, sendo jogado para longe em seguida por um chute com força total de Layla. Enquanto isso, Ludmilla era puxada para trás por suas correntes.
— Calminha aí, não vai fugir fácil assim.
Novamente, Layla se aproximou, movimentando a mão nua, enquanto Ludmilla jogava suas correntes para frente, tentando perfurá-la. Layla moveu a mão e sua enorme espada surgiu novamente. Facilmente, Layla começou a mover as mãos, deslizando entre as correntes que tentavam atingi-la e cortando-as com as mãos nuas, como se não fossem nada. Assim, ela encarou Ludmilla com um semblante horripilante, mas ainda sorrindo.
— Droga! Se quer mesmo se machucar...
Ludmilla saltou com sua espada na direção de Layla, realizando um corte vertical com toda a força, mas Layla bloqueou, segurando a lâmina com uma mão enquanto retirava uma de suas pistolas da cintura com a outra e disparava contra Ludmilla, enchendo-a de buracos e fazendo-a cuspir sangue.
De repente, enquanto via seu sangue voando pelo céu, Ludmilla começou a escutar gritos no fundo de sua cabeça. Irritada, seus olhos mudaram novamente. Ela segurou mais uma vez sua espada, agora com as duas mãos, e correu, desviando para o lado. Layla a perseguiu, mas desta vez Ludmilla parou, pegando-a de surpresa e realizando um corte horizontal que a lançou para frente. Então, Ludmilla dividiu sua enorme espada em duas menores, que começaram a se aquecer.
Enquanto Layla voava pelo ar, os pedaços da corrente que ela cortava com as mãos voaram na direção dela, conectando-se novamente e prendendo-a, impossibilitando-a de mover os braços. Ludmilla correu em alta velocidade até ela, com uma intenção assassina emanando de todo o seu corpo, e a partiu em dois.
Quando Ludmilla começou a voltar a si, percebendo o que havia feito, foi que tentáculos estranhos de sangue saíram das costas de Layla e perfuraram o estômago de Ludmilla, que foi pega de surpresa e jogada contra o prédio do outro lado. Reconectando seu torso às pernas, Layla voltou a ficar inteira e, usando seus tentáculos, puxou Ludmilla, que cuspia sangue, para perto dela.
Layla brincava com a mão, deslizando-a pelo abdômen aberto de Ludmilla, que ia perdendo as forças e apagando. Logo em seguida, ela lambeu o sangue que cobria sua mão e se preparava para dar o golpe final, quando Dante começou a gritar:
— Chega disso, Velvet!!
Layla deixou o corpo de Ludmilla cair no chão e saltou na direção de Dante, abraçando-o forte. Enquanto ele era tomado por aquele sentimento desconfortável e frio, sem saber como reagir, apenas olhava o estado em que Ludmilla havia ficado, enquanto escutava Layla:
— Eu sabia, eu sabia! Você lembra exatamente quem eu sou, não é, Dante?!
— Até parece que eu esqueceria de você...
Dante respondeu, incomodado. Ele sempre soube, sentindo no fundo do coração desde a primeira vez que pôs os olhos nela. Ainda assim, fingiu não perceber, querendo evitar pensar sobre isso, dizendo para si mesmo que era impossível, seja por conta do tempo ou do nome. Mesmo assim, dentro de si, ele sempre soube que era ela.
— Você é tão malvado! Por acaso se tornou esse tipo de homem desde que se separou de mim? Ignorando-me desse jeito e passando seu tempo com outra garota... Até fez comida para ela! Mas agora está tudo bem, não é? Agora podemos ficar juntos, afinal.
Layla falava, sorrindo e encarando-o com seu sorriso distorcido. Enquanto Dante, encarando-a, sentia apenas uma dor fria e esquisita dentro do peito, vendo o sangue das mãos da garota deslizar pelo seu rosto enquanto ela o segurava, ele não conseguia sorrir.
Enquanto a ouvia sorrindo e falando, mesmo não querendo pensar em nada, apenas algo passava por sua cabeça, ainda que ele tentasse se forçar a não pensar:
“Como pode sorrir assim? Como pode dizer isso, dizer que agora vamos ficar juntos, quando foi você quem, naquele dia, fugiu e se afastou de mim?”
Entrelinhas 1
— Opa, voltei! Hahaha, aposto que acharam que não me veriam de novo, hein? Eu consegui enganar o maninho Ordem para aparecer por aqui. Afinal, estava muito curiosa para saber quando “ela” iria aparecer.
— O quê? Você quer saber quem é ela?... Melhor não. Se eu der mais spoilers, o maninho Ordem não vai deixar barato. Mas qual é, você deve ter notado que algo estranho apareceu no último capítulo.
— Eu tô louca para ver o que ela vai fazer! Também queria saber como a fofa da Velvet foi de uma criança tão pura e inocente para uma louca ciumenta e possessiva. Bom, aposto que no próximo capítulo teremos essa resposta. Seria bom se dissesse quantos anos ela tem. Só eu que contei e notei que ela teria mais de 30?
— E aquele idiota do Chuya? Dá pra acreditar? Morrer por causa de uma barrinha de cereal!
Ela falava enquanto abria uma barrinha e começava a mastigar.
— Já imaginou morrer por algo assim... cof cof
A garota, que falava enquanto mastigava, acabou engasgando com a barrinha de cereal e começou a rolar no chão, lacrimejando, parecendo querer pedir ajuda.
— A narradora não vai morrer aqui...



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